O poder e a fúria sonoras do metal baiano, reconhecido tanto pelo seu fiel público local quanto pelos seus pares dentro e fora do Brasil, voltam à baila em grande estilo a partir desta quarta-feira, 28, e até domingo, 2, em mais uma edição do evento feirense DopeSmoke Festival – Metal com Dendê.
Realizado com sucesso e até atrações internacionais em 2018 e 2019, o DopeSmoke pulou 2020 por razões óbvias. Agora, em 2021, volta à cena devidamente online, graças ao fundamental incentivo da Lei Aldir Blanc (Estado da Bahia, por meio da Secretaria de Cultura e da Fundação Cultural do Estado da Bahia, via Lei Aldir Blanc, direcionada pela Secretaria Especial da Cultura do Ministério do Turismo).
Dados os devidos créditos a quem de direito, vamos ao que interessa: com três dias de shows (de sexta-feira a domingo), o DopeSmoke começou na verdade desde a sexta-feira passada (dia 16), com a oficina “Fotografia musical e cobertura coletiva”, com Duane Carvalho. Retomando as atividades, o festival abre de fato nesta sexta, 19h, com a conferência “Metal em pauta: o heavy metal e o rock na cultura baiana”. Já na quinta, 29, mesmo horário, rola a roda de conversa “A importância da cultura dos fanzines na difusão rock/metal no interior da Bahia”.
Mas os tímpanos só começarão a ser detonados mesmo a partir de sexta-feira, 19h, com as apresentações das bandas Legacy of the Dead, Sofie Jell, My Friend Is A Gray, Viscerall e Erasy. No sábado tem Papa Necrose, Behaviour, Human, Act of Revenge, Metalwar, Suffocation of Soul, Pestis e os pioneiros locais Headhunter D.C. Domingão rola Pilot Wolf, Infected Cells, God Funeral, Inner Call, Mercy Killing, Martyrdom e outra banda veterana fechando: Mystifier. Um cast totalmente representativo da qualidade e variedade da cena baiana (exceção feita às ausências das cultuadas Drearylands, The Cross e Malefactor).
Com esse line up 100% baiano, o DopeSmoke não poderia mesmo trazer outro tema que não “Metal com Dendê”.
“O dendê está em tudo nesta cena, o título reflete nessa ideia, claro, de se tratar de uma edição focada no nosso estado, mas também está nos detalhes, no sotaque, na batida e nos arranjos, claro que para a gente que está imerso nessa cena às vezes não percebemos com tanta clareza como a música pesada feita na Bahia tem personalidade”, afirma o produtor Joilson Santos.
“Mas o dendê é tão entranhado nessa estética que você não vai encontrar no mundo bandas iguais ao Mystifier, Martyrdom, Human, The Cross, Malefactor, Drearylands – nenhuma delas seria como são se fossem formadas em outro estado ou país”, diz.
Fora do ar desde a edição de 2019, a primeira edição online do DopeSmoke é também – salvo engano – o primeiro grande festival online do rock pesado do baiano. E chegou em boa hora: “Sim, também acredito que seja o primeiro festival virtual voltado para a música mais pesada. Acho que é uma ação fundamental nesta crise e que impulsiona o mercado da cultura, à medida que envolve uma série de profissionais para que ele seja possível e ao mesmo tempo que movimenta todo um cenário que inclusive ultrapassa as fronteiras do estado. Desde o início da pandemia que a gente tinha vontade de fazer algo neste sentido, mas a falta de recursos nos direcionava para formatos que a gente não curtia muito, como lives ali com o violão, ou com gravações editadas em cima de uma faixa gravada”, conta o produtor.
“A execução ao vivo de uma banda sempre foi uma coisa fundamental no rock e era mais essa vibe que a gente queria. A oportunidade surgiu no momento que abriu no estado o edital da Aldir Blanc voltado para festivais. Foi aí que organizamos a proposta, o projeto foi aprovado e estamos executando da melhor forma possível”, acrescenta.
Apoio estatal fundamental
Mesmo sendo profundo conhecedor da cena, Joílson afirma que fazer a curadoria das atrações não foi tarefa das mais fáceis, já que muitas bandas estão com as atividades temporariamente suspensas devido à pandemia. “Claro que um festival como este a gente pensa em inserir todos os principais nomes da cena. Mas foi bem complicado o trabalho de curadoria porque muitas bandas suspenderam as atividades na pandemia – algo que nos surpreendeu inclusive. Diversos nomes pararam tudo: gravação, ensaios. Isso dificultou muito nosso trabalho. O festival tinha como proposta envolver mesmo a cena de música pesada baiana. Os principais critérios eram que as bandas fossem baianas e que já tivesse algum trabalho lançado”, conta Joílson.
Sendo feirense na origem, as bandas oriundas de diversas cidades do interior tiveram um olhar especial. “A gente teve, sim, uma atenção especial com o interior porque a gente queria envolver todo o estado. Não tem mais nomes de cidades do interior porque tínhamos um prazo para preparar o festival e toda a questão do lockdown, e outras medidas restritivas atrapalharam a participação de algumas bandas”, relata.
Viabilizado graças ao incentivo estatal, o DopeSmoke 2021 inaugura – espera-se – um novo momento na relação da cena com órgãos institucionais, já que, ainda mais do que o rock convencional, o heavy metal é praticamente invisível na Bahia – mesmo constituindo uma cena muito respeitada e representativa.
“Ignorar toda a força de uma cena incrível como é o underground baiano seria assumir que está intervindo de forma negativa na cultura do estado. O metal produzido na Bahia também é música baiana e deve ter atenção igual das instituições que pensam políticas públicas”, afirma Joílson.
“Essa cena precisa de recursos, precisa continuar produzindo discos, fazendo shows, tendo espaço para respirar – e o estado tem por obrigação enxergar ela. Ignorá-la (e a muitas outras cenas) foi o que ocorreu durante muito tempo, o que criou aquela imagem famosa de que a Bahia só tinha axé music. Apostar na diversidade é fundamental para a cultura de qualquer estado. Ter um festival como o nosso, com apoio de editais públicos, mostra o quanto a Secult-BA está pensando à frente nas políticas públicas e na democratização de acesso a recursos de fomento à cultura”, conclui.